29/03/2010

MADRIGAL EXCÊNTRICO






















(J.)

Daqui, destas longes terras,
Para que o Estro se encarne,
A ti, que no corpo encerras
As harmonias da Carne,

Na asa dos vendavais
Envio um beijo tão longo,
Que as bocas, duas vogais,
Possam formar um ditongo!

António Feijó

Líricas e Bucólicas - 1884
Poesias Completas – Caixotim

20/03/2010

Vi meu irmão passando a ferro um pijama de flanela amarelo às listas


Eu comemoro, tu comemoras

Comemoramos o dia, que dia?
Mundial da poesia, dia oficial?
21 Março menos mal, sempre
Preferia que o dia regressasse
À poesia o silêncio entre linha
Ressoando no espaço sonhos
Imagens e traços nas clareiras
Com meus irmãos, era um só
Singular, tal somente a poesia

20 de Março 2010

17/03/2010

PENSO NO POEMA


Pamela Creevey


Penso no poema não nasce

na hora faz-me esperar em

lugares longínquos implora

que o deixe eu insisto além

do vazio em volta eu existo

na vida que ganha e resiste

16/3/2010

10/03/2010

O MAIS CERTO


Fotografia de Hélder Gonçalves

O mais certo é um dia tudo acabar
mesmo a memória de outros tempos,
esquecem-se os rostos que fitámos
desobedecem-nos os conhecimentos.

O que é mais tarde? É o momento
em que o presente se torna passado

25/02/2010

02/03/2010

A perfeição do nada


Fotografia de Hélder Gonçalves

Um poeta morre e os jornais choram,
soluçam os amigos do homem e aquela
que o amou e as que não o esqueceram.
Alcançou enfim a eternidade, ele. Tanto
lhe faz já este ano ou o próximo, os vinte
séculos da nossa civilização ou o fim dela
e de nós todos. Agora ele senta-se à beira
das florestas irreais do sonho, perto dos
lagos. O conceito de tempo é-lhe inacessível,
já não limita a sua ideia do real. Deixou-nos
as palavras arrumadas nos livros, trabalho
ou prazer apurados. Contou-nos episódios
da sua experiência, mesmo quando nada
tinham a ver com a sua biografia real. Não
há nada mais irrisório do que aspirar a
escrever um poema sobre o poeta
que acaba de morrer. O tempo, só ele,
o ressuscitará, antes de deixá-lo de novo
esquecido na poeira dos séculos. Inexistente
o que um dia existiu. De que serve os
outros falarem de nós? Viver e construir
a nossa morte com sabedoria. Só isso
conta. Será verdade que as palavras
deixaram de cumprir o seu dever? Pode
não ser. No mundo que o poeta organizou
pedaços de si foram-nos legados como aviso
e consolação. Agora, depois dos últimos
dias de sofrimento, o poeta descansa enfim
em paz, longe do desejo e do remorso.
Atingiu a perfeição insensível do nada.

João Camilo, in A Ambição Sublime, Fenda