30/06/2007

MEMÓRIAS - I

Posted by PicasaFotografia de Hélder Gonçalves

Aquela singular corrente de memórias voa no tempo
Revolto-me em mudança permanente com o espelho
No qual espreito e nele me revejo em reminiscências
De mim naqueles olhares pacientes de mãos quentes
Abertas ao contar dos dias ou fechadas como punhos
Em seus gestos diligentes revendo o futuro do futuro
Com a morte pendurada nas paredes, os meus muros
São transparentes de cal pura brancos sem espessura
E o meu sangue goteja dos retratos sem que me veja.

Lisboa, 5 de Setembro de 2006

28/06/2007

NOTÍCIA

Posted by PicasaAngelle

As ilusões de uma vida mortas

Surgiu uma notícia inesperada

O olhar entristeceu por dentro

Como na morte da madrugada

Um dia a mais outro de menos

Tudo o que se quiser anunciar

Menos a noticia feita presente

Fez-se silêncio na madrugada

24/05/2007
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26/06/2007

PERTO DE TI

Posted by PicasaPamela Creevey

Estou aqui perto de ti
Embora não me oiças

Regressei do silêncio
Do qual um dia parti

Não sentes o assobio
Do vento na esquina?

O outro lado da vida
Que tua vida não viu

Lisboa, 13 de Junho de 2007
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24/06/2007

ÍTACA

Posted by PicasaImagem daqui

Quando saíres a caminho da ida para Ítaca,
faz votos para que seja longo o caminho,
cheio de aventuras, cheio de conhecimentos.
Os Lestrígones e os Ciclopes,
o zangado Poséidon não temas,
coisas assim no teu caminho não acharás nunca,
se o teu pensamento permanecer elevado, se emoção
requintada o teu espírito e o teu corpo tocar.
Os Lestrígones e os Ciclopes,
o selvagem Poséidon não encontrarás,
se com eles não carregares na tua alma,
se a tua alma não os colocar à tua frente.

Faz votos para que seja longo o caminho.
Para que sejam muitas as manhãs de verão
nas quais com que contentamento, com que alegria
entrarás em portos vistos pela primeira vez;
para que páres em feitorias fenícias,
e para que adquiras as boas compras
coisas de nácar e coral, de âmbar e de ébano,
e essências de prazer de qualquer espécie,
quanto mais abundantes puderes essências de prazer;
para que vás a muitas cidades egípcias,
para que aprendas e aprendas com os letrados.

Deves ter sempre Ítaca na tua mente.
A chegada ali é o teu destino.
mas não apresses em nada a tua viagem.
É melhor durar muitos anos;
e já velho fundeares na ilha,
rico do que ganhaste no caminho,
sem esperares que dê Ìtaca riquezas.

Ítaca deu-te a bela viagem.
Sem Ítaca não terias saído do caminho.
Mas já não tem para te dar.

E se um tanto pobre a encontrares, Ítaca não te enganou.
Sábio como te tornaste, com tanta experiência,
já hás-de de compreender o que significam Ítacas.

[1911]

Konstandinos Kavafis

In “Os Poemas” – Tradução de Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratsinis

Relógio d´Água, Julho de 2005.
[A última tradução credível, em língua portuguesa, da poesia de Kavakis.]

[Depois de ler esta citação.]
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23/06/2007

UMA LUZ


Uma luz trémula ao fundo da vida
Bruxuleia fria incrédula sobrevive
Uma luz ténue de esperança clareia
O destino é incerto o tempo espera
Uma luz clara que ilumina o futuro
Faz forte a vida clamor sem trégua
Uma luz quente não mais se apaga
E ignora as vidas duras que alumia
Uma luz que se derrama qual gota
De sol que me ilumina e incendeia

13/4/2007
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21/06/2007

CLARÃO DE LUZ

Posted by PicasaKim Hunter

Ao longe um clarão de luz azul
Fechei os olhos desenhei o mar
Da minha infância o murmúrio
Que se insinua loucos prazeres
Desenhados nas veias salientes
Das mãos que me rodearam de
Carícias mãos que se perderam
Doridas na imensidão do gesto
De criar mundo sem nada mais
Pedir de volta senão lembrança

18/05/2007
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19/06/2007

ANTIGA DOR

Posted by PicasaTeixeira de Pascoais

O subtil, o reflexo, o vago, o indefinido,
Tudo o que o nosso olhar só vê por um momento,
Tudo o que fica na Distância diluído,
Como num coração a voz do sentimento.
Tudo o que vive no lugar onde termina
Um amor, uma luz, uma canção, um grito,
A última onda duma fonte cristalina,
A última nebulosa etérea do Infinito...
Esse país aonde tudo principia
A ser névoa, a ser sombra ou vaga claridade,
Onde a noite se muda em clara luz do dia,
Onde o amor começa a ser uma saudade;
O longínquo lugar aonde o que é real
Principia a ser sonho, esperança, ilusão;
O lugar onde nasce a aurora do Ideal
E aonde a luz começa a ser escuridão...
A última fronteira, o último horizonte,
Onde a Essência aparece e a Forma terminou...
O sítio onde se muda a natureza inteira
Nessa infinita Luz que a mim me deslumbrou!...
O indefinido, a sombra, a nuvem, o apagado,
O limite da luz, o termo dum amor
Tornou o meu olhar saudoso e magoado,
Na minha vida foi minha primeira dor...
Mas hoje, que o segredo oculto da Existência,
Num momento de luz, o soube desvendar,
Depois que pude ver das Cousas a essência
E a sua eterna luz chegou ao meu olhar,
Meu infinito amor é a Alma universal,
Essa nuvem primeira, essa sombra d’outrora...
O Bem que tenho hoje é o meu antigo Mal,
A minha antiga noite é hoje a minha aurora!...

Teixeira de Pascoais
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17/06/2007

TARDE OU CEDO

Posted by PicasaJohn Chervinsky US, b.1961

Por debaixo do tempo, tarde ou cedo,
O medo da hora marcada, ser tarde
No dia amanhecido, perdurar perdido
Por debaixo do tempo, partir a medo
De chegar tarde onde se interrompe
O grito infinito na planura do não dito.

Lisboa, 17 de Junho de 2007
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SOONER OR LATER

Under time, sooner or later,
Fearing the set time, it can be late
On the rising day, lasting lost
Under time, leaving fearful
Of getting late, where the endless cry
Is broken on the plain of the unsaid.

[O John Chervinsky encontrou uma sua fotografia, que eu escolhera para “ilustrar” um poema e, através de um comentário, manifestou interesse em conhecer o poema para o que seria necessário traduzi-lo. Pedi à Anália Gomes, que não é poeta, mas conhece do mister da tradução, o empenho na mesma. É um risco assumido e o resultado foi este. O John gostou que é o que mais interessa.]
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16/06/2007

LUGAR IMÓVEL

Posted by PicasaSonja Thomsen

Caminhei ao longo do tempo atapetado de flores
Ao longe, desenhada a traço azul, a curva do mar

Lisboa, 3 de Junho de 2007
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14/06/2007

TALVEZ ESCREVA

Posted by Picasaalbert lemoine

Talvez escreva de menos tarde no tempo
Certamente assumo como meus os bichos
Que enojam as púdicas criaturas de deus
Eriçadas pelas asas das moscas pousadas
Na marmelada ou o rastejar da lagartixa
Verde pobre coitada lentamente a caminho
De sua moradia entre canas entrelaçadas

9/3/2007
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12/06/2007

OH! DOCE SILÊNCIO

Posted by PicasaFotografia de Hélder Gonçalves

Oh! Doce silêncio na noite atormentada
Agora seca de águas e escura de pesadelos
Torna-me leve a mão que pensa
Mais do que eu sou capaz com a cabeça

Alonga-te para me tomares em teus braços
E neles me recolheres em azuis
Regaços de radiosas tonalidades suspensas
Os olhares penetrantes plenos de carícias

Abriga-me dos cansaços que me tolhem o corpo
E se vão quando me rendo à subtil sedução
Dos gestos novos nascidos sei lá donde
E deles sempre renasço e afinal sobrevivo

Oh! Doce silêncio entrecortado pelo silvo
Do rompante clarão de qualquer ideia solene
Que o grito tenso logo destrói
Tornando-me fiel à sabedoria do tempo

Ao longe ainda soam as tonitruantes guilhotinas
Luzidias nas suas finas fraquezas
Não queria pensar nessas iníquas máquinas
De assassinar os sonhos que me restam

Oiçam o silêncio que nasce por dentro de vós
Olhem a natureza que se desprende do céu
Com lágrimas inundando os sorrisos
É a liberdade raiando na festa da madrugada

Lisboa, 21 de Abril de 2007
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11/06/2007

POESIA EM DIA

[Auto-retrato]

É arriscado escrever para o ar, ser observado
não poder ripostar ao silêncio dos cargueiros
a deslizar do outro lado, lentamente devagar
como se nos quisessem brindar com uma tela
na qual os traços são afinal o real imaginado

a melodia baila e eles não sabem que o sonho

……………………

É arriscado escrever e nos lermos mais tarde
as linhas atribuladas nas curvas da memória
dúvidas desalinhos pressas e frases montadas
em cima dos caminhos nunca antes trilhados
como o regresso ao saguão das águas furtadas

o verso brilha tal qual o brilho que lhe ponho

……………………….

É arriscado todo o gesto que muda o sentido
aos ponteiros do relógio e escrever ao invés
como fiz no outro dia aid ortuo on zif omoC
alcançar a simetria e deixar correr a fantasia
que se evapora e corre corre o tempo da vida

como nas mãos da criança uma bola colorida

…………………….......

(2006)

[A pensar em António Gedeão, um dos maiores poetas da língua portuguesa, no centenário do seu nascimento, cuja ascendência, por curiosidade, é originária do Algarve e, na maioria, da minha terra – Faro.]
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10/06/2007

OS CASTELOS

A Europa jaz, posta nos cotovelos:
De Oriente a Ocidente jaz, fitando,
E toldam-lhe românticos cabelos
Olhos gregos, lembrando.
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O cotovelo esquerdo é recuado;
O direito é em ângulo disposto.
Aquele diz Itália onde é pousado;
Este diz Inglaterra onde, afastado,
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A mão sustenta, em que se apoia o rosto.
Fita, com olhar sphyngico e fatal,
O Ocidente, futuro do passado.
O rosto com que fita é Portugal.

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Europa yace, puesta en los codos:
De Oriente a Occidente yace, mirando,
Y cúbrenle románticos cabellos
Ojos griegos, recordando.
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El codo izquierdo es reculado;
El derecho es un ángulo dispuesto.
Aquél dice Italia donde es posado;
Este dice Inglaterra donde, alejado,
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La mano sustenta, en que se apoya el rostro.
Mira, con el mirar sphyngico y fatal,
El occidente, futuro del pasado.

09/06/2007

POESIA

Posted by PicasaDane Shitagi USA, b.1972

Poesia uma dança de palavras sem medo
volteando em torno do seu próprio silêncio
ora de oiro ora de prata

Poesia um tempo solitário assumido
no limite do espaço infindável da invenção
ora sonho ora nada

Poesia um caminho que se alarga crente
no tempo luminoso de uma vida irrepetível
ora livre ora escrava

Poesia uma plenitude nunca alcançada
o espaço da verdade dita ao ritmo da palavra
ora escrita ora apagada

Lisboa, 4 de Junho de 2007
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08/06/2007

Caderno de Poesia

Quando em Dezembro de 2003 criei o absorto pensei que nunca publicaria poesia, de minha autoria, num blog. Uns tempos mais tarde apeteceu-me romper com essa decisão. Passados mais de três anos amadureci a ideia de criar um espaço autónomo, e depurado, para a poesia. Assim será!