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29/04/2009
SAUDADES
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Que luz mais forte me alumiou
Os sentidos sob o sol dourado,
Põe o chapéu dizia minha mãe
E rebelde fugia para o telhado.
Que cheiros mais inebriantes
Os canteiros floridos de rosas,
Assoa o nariz dizia minha mãe
Caindo eu quedas desditosas.
Que luz mais forte me alumiou
Os dias senão o sorriso franco
De minha mãe por vezes triste
Os pés firmes no chão branco.
Lisboa, 5 de Março de 2009
Os sentidos sob o sol dourado,
Põe o chapéu dizia minha mãe
E rebelde fugia para o telhado.
Que cheiros mais inebriantes
Os canteiros floridos de rosas,
Assoa o nariz dizia minha mãe
Caindo eu quedas desditosas.
Que luz mais forte me alumiou
Os dias senão o sorriso franco
De minha mãe por vezes triste
Os pés firmes no chão branco.
Lisboa, 5 de Março de 2009
27/04/2009
OFÍCIO DIÁRIO
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25 de Abril
O longamente esperado dia
O longamente esperado dia
de todas as promessas e intenções
chegou enfim vestido de poesia
e de flores e canções.
.
Mas depressa o nevoeiro
toldou o que era puro e era inteiro,
mostrando que não trazia
no seu bojo nenhum Sebastião
capaz de exorcizar a sensação
de letargia.
.
E no entanto ficou como fronteira
das nossas vidas
desde aí para sempre divididas
de tal maneira
que amiúde a conversa nos impele
a falar do antes e depois dele.
.
Torquato da Luz
25/04/2009
25 de ABRIL
21/04/2009
AO ENTARDECER
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Fotografia de Hélder Gonçalves
Ao entardecer, debruçado pela janela,
E sabendo de soslaio que há campos em frente,
Leio até me arderem os olhos
O livro de Cesário Verde.
.
Que pena que tenho dele!
Ele era um camponês
Que andava preso em liberdade pela cidade.
Mas o modo como olhava para as casas,
E o modo como reparava nas ruas,
E a maneira como dava pelas cousas,
É o de quem olha para árvores,
E de quem desce os olhos pela estrada por onde vai andando
E anda a reparar nas flores que há pelos campos...
.
Por isso ele tinha aquela grande tristeza
Que ele nunca disse bem que tinha,
Mas andava na cidade como quem anda no campo
E triste como esmagar flores em livros
E pôr plantas em jarros...
-----------------------
Al atardecer, asomado por la ventana,
Al atardecer, asomado por la ventana,
Y sabiendo de soslayo que hay campos en frente,
Leo hasta que me arden los ojos
El libro de Cesário Verde.
.
¡Que pena tengo de él!
Él era un campero
Que andaba preso en libertad por la ciudad.
Pero el modo en que miraba hacia las casas,
Y el modo como reparaba en las calles,
Y la manera como daba por las cosas,
Es el de quien mira hacia los árboles,
Y de quien desciende los ojos por el camino por donde va andando
Y anda reparando en las flores que hay por los campos...
.
Por eso él tenía aquella gran tristeza
Que él nunca dijo bien que tenía,
Pero andaba en la ciudad como quien anda en el campo
Y triste como aplastar flores en libros
Y poner plantas en jarros...
.
F E R N A N D O P E S S O A
18/04/2009
17/04/2009
HARTZ
16/04/2009
éramos tan puros ...
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É difícil viver de sonhos,
mas não é impossível viver
de sonhos. É difícil viver
sem sonhos, mas não é
impossível. Viver é difícil.
Afinal éramos tan puros …
27/07/2007
[Título/epígrafe - verso do
“Poema por Virgilio Pînera”
do poeta cubano Alberto
Acosta-Pérez - Havana – 1957]
14/04/2009
blog com palavras ao fundo
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anoitece. o céu é de sangue.
sob o grafismo luzente
do sol nas águas, assim também o mar.
num silêncio pesado
toma para si as dores de todos os que nele
viveram ou morreram em mágoa.
a noite é de luto.
meu olhar distante evoca a nau
em que embarcarei meu coração.
.
longe pressinto a respiração do meu destino.
13/04/2009
AO LONGE
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ROBERT BONK
Ao longe vejo as flores nos canteiros
em casa de meus pais longos dias en
tre cheiros divinais sem medida nem
outro sentido senão as transparências
Ao longe o beijo na face de que ficou
o traço que pressinto e não vejo embo
ra todas as bocas sejam sagradas quan
do por amor nos beijam e nos deixam
Ao longe o mar povoado de infinito ar
fando por chegar à costa calmo manso
molhando os pés descalços cuidado vê
lá se te molhas! E corrias a agarrar-me
Ao longe navegam as gentes para além
da memória que vive comigo, esqueço
o lugar exacto, o cheiro a flores bravas
plantadas num canto do mundo antigo
7/4/2009
Ao longe vejo as flores nos canteiros
em casa de meus pais longos dias en
tre cheiros divinais sem medida nem
outro sentido senão as transparências
Ao longe o beijo na face de que ficou
o traço que pressinto e não vejo embo
ra todas as bocas sejam sagradas quan
do por amor nos beijam e nos deixam
Ao longe o mar povoado de infinito ar
fando por chegar à costa calmo manso
molhando os pés descalços cuidado vê
lá se te molhas! E corrias a agarrar-me
Ao longe navegam as gentes para além
da memória que vive comigo, esqueço
o lugar exacto, o cheiro a flores bravas
plantadas num canto do mundo antigo
7/4/2009
09/04/2009
LINHA DE CABOTAGEM III
08/04/2009
O tempo do cansaço profundo
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O tempo do cansaço profundo do corpo lasso suspenso
De um futuro com notícias frescas trazidas pelo vento
Não sei se o tempo atrás passado com suas conveniências
Silêncios gestos palavras uma história de famílias antigas
Conta para desenhar o futuro ao menos nos genes dos filhos
O tempo passa lentamente por entre as desilusões da vida
E no cimo da energia que nos anima o olhar vemos o passado
Com todas as amantes lugares desejos momentos e lascívias
Morto ou vivo vemos o tempo e nele a nossa vida dentro
Em círculos que nos apertam a alma e nos abafam o lamento
16/7/2008
07/04/2009
PEQUENA ANTOLOGIA DE POETAS NEOLATINOS
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Só, incessante, um som de flauta chora,
Viúva grácil, na escuridão tranqüila,
- Perdida voz que de entre as mais se exila,
- Festões de som dissimulando a hora.
Na orgia, ao longe, que em clarões cintila
E os lábios, branca, do carmim desflora...
Só, incessante, um som de flauta chora,
Viúva, grácil, na escuridão tranqüila.
E a orquestra? E os beijos? Tudo a noite, fora,
Cauta, detém. Só modulada trila
A flauta flébil... Quem há de remi-la?
Quem sabe a dor que sem razão deplora?
Só, incessante, um som de flauta chora....
Camilo Pessanha
05/04/2009
a caminho do futuro incerto
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Albert Lemoine
A caminho do futuro incerto
se joga a minha vida
e os gestos dela,
tudo se joga menos a pura
beleza daquela face
e o meu olhar nela.
Não seria capaz de viver
fora da beleza
e um olhar por vezes basta
a novidade do breve desejo
arrebatado ou o triste
aceno de despedida.
Chegar e partir abrir a mão,
apertar os lábios,
lamber as feridas,
sorver as lágrimas que caem
pelo rosto desabridas,
e não perder o trilho.
Amar o dia como a um filho
que se viu nascer,
admirar a beleza de um rosto
na aurora do anoitecer,
beleza que ilumina o caminho
e me faz crer.
Não posso viver sem a beleza
aqui onde sinto o corpo
oblíquo em delírio
ou no lugar do desejo já morto
os meus sentidos
se perdem ao perdê-la.
Lisboa, 31 de Agosto de 2003
[Variante, datada, e com outro título, do poema “Não posso viver fora da beleza”]
A caminho do futuro incerto
se joga a minha vida
e os gestos dela,
tudo se joga menos a pura
beleza daquela face
e o meu olhar nela.
Não seria capaz de viver
fora da beleza
e um olhar por vezes basta
a novidade do breve desejo
arrebatado ou o triste
aceno de despedida.
Chegar e partir abrir a mão,
apertar os lábios,
lamber as feridas,
sorver as lágrimas que caem
pelo rosto desabridas,
e não perder o trilho.
Amar o dia como a um filho
que se viu nascer,
admirar a beleza de um rosto
na aurora do anoitecer,
beleza que ilumina o caminho
e me faz crer.
Não posso viver sem a beleza
aqui onde sinto o corpo
oblíquo em delírio
ou no lugar do desejo já morto
os meus sentidos
se perdem ao perdê-la.
Lisboa, 31 de Agosto de 2003
[Variante, datada, e com outro título, do poema “Não posso viver fora da beleza”]
O LIVRO DOS SERES IMAGINÁRIOS
04/04/2009
90 ANOS
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A aragem não enganava o lugar dela
nem o seu sopro poupava os corpos
correndo suave um hálito escaldante
e até a sombra das árvores mudaram
o tom da frescura conforme o género
da folhagem e a formatura das copas,
Caminhamos desde o fim dos tempos
pelos mesmos caminhos de pé posto
em que se levantam em pó os passos
e tudo mudou no lugar do seu berço
mas nada nas árvores mudou presas
nas terras revoltas a golpes de vento,
Nada mudou no olhar azul do homem
feito nas colheitas de todos os frutos
nem a nostalgia das perdas do tempo
cujo desenho do rosto perdura no viço
dos moços pequenos sentados à parte
perdidos de se largarem às suas artes,
Os adultos alinhados à mesa lembram
o relincho da charrua puxada a mãos
e rodas de canções cantadas em coro
na aragem que não mudou o seu visco
e nada mudou no lugar do nascimento
da vida que agora ressurge celebrada,
Ventura marcou o lugar no seu tempo
entoando vigoroso uma canção à terra
sagrada da pertença de todos os sonhos
noventa anos cantados a solo ali dentro
de nós com os antepassados sorridentes
olhos agradecidos à sua esperança feliz.
Santo Estevão e Lisboa, Julho de 2003
nem o seu sopro poupava os corpos
correndo suave um hálito escaldante
e até a sombra das árvores mudaram
o tom da frescura conforme o género
da folhagem e a formatura das copas,
Caminhamos desde o fim dos tempos
pelos mesmos caminhos de pé posto
em que se levantam em pó os passos
e tudo mudou no lugar do seu berço
mas nada nas árvores mudou presas
nas terras revoltas a golpes de vento,
Nada mudou no olhar azul do homem
feito nas colheitas de todos os frutos
nem a nostalgia das perdas do tempo
cujo desenho do rosto perdura no viço
dos moços pequenos sentados à parte
perdidos de se largarem às suas artes,
Os adultos alinhados à mesa lembram
o relincho da charrua puxada a mãos
e rodas de canções cantadas em coro
na aragem que não mudou o seu visco
e nada mudou no lugar do nascimento
da vida que agora ressurge celebrada,
Ventura marcou o lugar no seu tempo
entoando vigoroso uma canção à terra
sagrada da pertença de todos os sonhos
noventa anos cantados a solo ali dentro
de nós com os antepassados sorridentes
olhos agradecidos à sua esperança feliz.
Santo Estevão e Lisboa, Julho de 2003
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