13/07/2007

NÃO QUERER

Posted by PicasaBill Kane

Não entro
se me não estou para dar.
Não digo
adeus nem até já.
Assim mesmo acredito
me não enganar de ti.
Mais não necessito
manso interlocutor distante
do que ouvir surdo teu coice.
Alta maré alto mar
Alto aí sem mais
que te conheço.
Mas não entro
se me não estou para dar.

15/9/1980

[Este poema foi editado numa “publicação”
policopiada no Natal de 1980 que descrevi
assim: “5 pares de poemas para alguns amigos
sem ofensa para Jorge de Sena. Deste são os
cinco retirados da
Poesia I e de 40 Anos de
Servidão e o último solto de que gosto muito
e é o pai dos meus.” Acontecera que, tendo
Jorge de Sena morrido em 4 de Junho de 1978,
iniciara a leituras extensiva da sua obra e me
apaixonara pela sua poesia. É o que explica
que, nesta “publicação” artesanal, tenha ousado
emparelhar 5 poemas de Jorge Sena com cinco
dos meus primeiros poemas. Imaginem!]

O poema de Sena que escolhi para emparelhar
com “Não querer” foi:

“Nunca ninguém ao certo …”

Nunca ninguém ao certo nos conhece
Quem bem repara menos vê ou vê
mais e melhor o quanto reparou.
Por isso, anos passados, recordando,
folheando as folhas para tal guardadas,
olhando uns vãos desenhos em que há sempre
sebentas, livros, um amor sabido,
e lendo versos em que há sempre livros,
o mesmo amor, sebentas, e talvez
alguma graça já sem graça alguma,
tão docemente o recordar se aviva,
que não distingue … outros recorda … esquece.

E como reparar-se em quem não pára?
Em quem do Porto a Coimbra se prepara
para a viagem de Coimbra ao Porto?
Em quem trabalha e estudo em correria
sem ter tempo a perder na Academia?

E pois que da amizade nestes livros
só ficará quanta morrer na vida,
folheai, lembrai, guardai nos papéis velhos,
que o resto, o mais, o que afinal é tudo,
aqui não está – ou, estando, não é vosso.

Jorge de Sena

6/2/48

1 comentário:

hfm disse...

Gosto de ousadias, gosto, acima de tudo, de poesia e nos dois casos ela está nos poemas.